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terça-feira, 16 de junho de 2009

Deixando de lado os medos e traumas, vale uma reflexão voltada exclusivamente para viver.

A morte no meio do Oceano Atlântico. Sem que você perceba, ou possa fazer qualquer coisa a respeito, sua vida acabou. Numa bola de fogo ou nos 4 000 metros de água congelante abaixo de você naquele mar sem fim. Você que tinha acabado de conseguir dormir na poltrona ou de colocar os fones de ouvido para assistir ao primeiro filme da noite ou de saborear uma segunda taça de vinho tinto com o cobertorzinho do avião sobre os joelhos. Talvez você tenha tido tempo de ter a consciência do fim, de que tudo terminava ali. Talvez você nem tenha tido a chance de se dar conta disso. Fim.

Tudo que ia pela sua cabeça desaparece do mundo sem deixar vestígios. Como se jamais tivesse existido. Seus planos de trocar de emprego ou de expandir os negócios. Seu amor imenso pelos filhos e sua tremenda incapacidade de expressar esse amor. Seu medo da velhice, suas preocupações em relação à aposentadoria. Sua insegurança em relação ao seu real talento, às chances de sobrevivência de suas competências nesse mundo que troca de regras a cada seis meses. Seu receio de que sua mulher, de cuja afeição você depende mais do que imagina, um dia lhe deixe. Ou pior: que permaneça com você infeliz, tendo deixado de amá-lo. Seus sonhos de trocar de casa, sua torcida para que seu time faça uma boa temporada. Suas noites de insônia, essa sinusite que você está desenvolvendo, suas saudades do cigarro. Os planos de voltar à academia, a grande contabilidade (nem sempre com saldo positivo) dos amores e dos ódios que você angariou e destilou pela vida, as dezenas de pequenos problemas cotidianos que você tinha anotado na agenda para resolver assim que tivesse tempo. Bastou um segundo para que tudo isso fosse desligado. Para que todo esse universo pessoal que tantas vezes lhe pesou toneladas tenha se apagado. Como uma lâmpada que acaba e não volta a acender mais. Fim.

Então, aproveite bem o seu dia. Extraia dele todos os bons sentimentos possíveis. Não deixe nada para depois. Diga o que tem para dizer. Demonstre. Seja você mesmo. Não guarde lixo dentro de casa. Não cultive amarguras e sofrimentos. Prefira o sorriso. Dê risada de tudo, de si mesmo. Não adie alegrias nem contentamentos nem sabores bons. Seja feliz. Hoje. Amanhã é uma ilusão. Ontem é uma lembrança. No fundo, só existe o hoje.
Texto: Adriano Silva, em 04/06/2009, Revista Exame

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Namorado

Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namorado de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia.

Namorado não precisa ser o mais bonito, mas ser aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio, e quase desmaia pedindo proteção.
Quem não tem namorado não é quem não tem amor: é quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento, dois amantes e um esposo; mesmo assim pode não ter nenhum namorado. Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema, sessão das duas ou drible no trabalho.
Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele; abobalhados de alegria pela lucidez do amor.
Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros.
Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada ou meio-dia do dia de sol em plena praia cheia de rivais.
Não tem namorado quem ama sem se dedicar, quem namora sem brincar, quem vive cheio de obrigações.
Se você não tem namorado é porque não enlouqueceu aquele pouquinho necessário para fazer a vida parar e, de repente, parecer que faz sentido.

Texto: Artur da Távola

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Viver Despenteada...


Hoje aprendi que é preciso deixar que a vida te despenteie, por isso decidi aproveitar a vida com mais intensidade… O mundo é louco, definitivamente louco…
O que é gostoso, engorda.
O que é lindo, custa caro.

O sol que ilumina o teu rosto, enruga.

E o que é realmente bom dessa vida, despenteia…
- Fazer amor, despenteia.

- Rir às gargalhadas, despenteia.

- Viajar, voar, correr, entrar no mar, despenteia.
- Tirar a roupa, despenteia.

- Beijar a pessoa amada, despenteia.
- Brincar, despenteia.
- Cantar até ficar sem ar, despenteia.

- Dançar até duvidar se foi boa idéia colocar aqueles saltos gigantes essa noite, deixa seu cabelo irreconhecível…

Então, como sempre, cada vez que nos vejamos eu vou estar com o cabelo bagunçado…
mas pode ter certeza que estarei passando pelo momento mais feliz da minha vida.
É a lei da vida: sempre vai mais despenteada a mulher que decide ir no primeiro carrinho da montanha russa.

Pode ser que me sinta tentada a ser uma mulher impecável, toda arrumada por dentro e por fora, o aviso de páginas amarelas deste mundo exige boa presença:
Arrume o cabelo, coloque, tire, compre, corra, emagreça, coma coisas saudáveis, caminhe direito, fique séria…
Mas o que realmente importa é que, ao me olhar no espelho, veja a mulher que quero ser.

Por isso, minha recomendação a todas as mulheres:
Entregue-se, coma coisas gostosas, beije, abrace, dance, apaixone-se, relaxe, viaje, pule,
corra, voe, cante, arrume-se para ficar linda, arrume-se para ficar confortável, admire a paisagem, viva, e acima de tudo, deixa a vida te despentear!!!
O pior que pode acontecer é que, rindo frente ao espelho, você precise se pentear de novo...


Desconheço a autoria do texto, recebido por e-mail.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

CLARICE LISPECTOR


"Não pense que a pessoa tem tanta força assim, a ponto de levar qualquer espécie de vida e continuar a mesma. Até cortar os defeitos pode ser perigoso - nunca se sabe qual o defeito que sustenta nosso edifício inteiro...há certos momentos em que o primeiro dever a realizar é em relação a si mesmo.
Quase quatro anos me transformaram muito. Do momento em que me resignei, perdi toda a vivacidade e todo interesse pelas coisas. Você já viu como um touro castrado se transforma em boi. Assim fiquei eu...Para me adaptar ao que era inadaptável, para vencer minhas repulsas e meus sonhos, tive que cortar meus grilhões - cortei em mim a forma que poderia fazer mal aos outros e a mim. E com isso cortei também a minha força.
Ouça: respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que imagina que é ruim em você - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse seu único meio de viver. Juro por Deus que, se houvesse um céu, uma pessoa que se sacrificou por covardia ia ser punida e iria para um inferno qualquer. Se é que uma vida morna não é ser punida por essa mesma mornidão. Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe pertence é tudo o que sua vida exige. Parece uma vida amoral. Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma. Gostaria mesmo que você me visse e assistisse minha vida sem eu saber. Ver o que pode suceder quando se pactua com a comodidade da alma".
Texto: Clarice Lispector
Imagem: NET

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Mães são Anjos


Todos sabemos que datas comemorativas - Natal, dia dos Namorados, Dia dos Pais, Dia das Mães - foram instituídas pelo comércio, para acelerar as vendas. Nestas épocas de crise financeira mundial, ajudam a manter a economia e o emprego.
Todavia, os críticos esquecem ou desconhecem um detalhe fundamental: a energia planetária de AMOR, nesses períodos, vibram com mais intensidade, as pessoas sentem-se ser humano melhor presenteando, oferecendo naquele pacote ou naquela flor parcela intensa de seu amor pelo outro.
E existe Amor maior do que o que da mãe por seu filho? A recíproca nunca é verdadeira, mas no segundo domingo do mês, e nos dias que antecedem o dia das Mães, todos nós queremos de alguma forma agradecer esse AMOR, com uma prece para aqueles mães e avós que já partiram; um telefonema para as que estão distantes; uma flor, um pacote, um abraço para aqueles que ainda estão entre nós.
E como bem traduz Silvana Duboc nesse texto, Mães são Anjos:

Dizem que anjos vivem no céu
e que na terra só existem pessoas,
algumas ruins, outras boas.
Afirmo, no entanto,
que somente metade dos anjos
vive junto do sol e próximos da lua.

Tais anjos são as mães,
como a sua, que partiram...
para do alto iluminar
a vida de seus filhos...
que, de perto,
não puderam acompanhar.

A outra metade dos anjos vive em terra firme,
sem asas nem auréola,
disfarçados em meio a multidão
e seu órgão principal é o coração.
Tanto os anjos que partiram
quanto os que vivem aqui
têm um nome que eu escolhi: MÃE!

E, também, decidi
que mães podem errar...
às vezes, fraquejar...
Por que, enquanto humanas,
nunca serão a imagem da perfeição.

E por isso eu dei à elas, então,
o melhor tipo de coração.
Ele é elástico,
ama igualmente quantos filhos tiver.
É feito de aço e agüenta o que vier.
Dói sem sangrar
e não tem limites para se doar.

Possui uma capacidade de recuperação
que supera com rapidez qualquer tipo de situação.
Escolhi que o coração das mães
nunca seria juiz, jurado, delegado.
Jamais imporiam penas,
seus filhos sempre seriam perdoados.
Escolhi que isso seria um legado.

Mães seriam a salvação do mundo
quando tudo estivesse destroçado.
Finalmente, em todas as mães
eu coloquei tudo
que na minha mãe eu encontrei!

E hoje eu vejo por aí uma constelação,
uma incrível imensidão de Isabelas e Silvanas,
Mirians e Rosanas, Lídias e Lucianas,
Maria e Marianas, Claudias e Anas...
Elas se tornaram
a imagem da Minha Mãe.

Fiz um molde tão perfeito,
uma obra tão especial
que me dou o direito de agradecer
em nome dos anjos
a nossa mãe original - MARIA.

Eu fiz o molde, mas foi MARIA
que a milhares de anjos ensinou
o tanto que me amou!
Feliz dia das Mães!!!
Feliz dia dos Anjos!!!


sábado, 2 de maio de 2009

De bem com a vida


A felicidade é mesmo um estado mágico e duradouro, como sempre ensinaram? Melhor não contar com isso. Aprenda a apreciá-la em doses mínimas e nas alegrias de pequeno porte.
A felicidade é a soma das pequenas felicidades. Li essa frase num outdoor em Paris e soube, naquele momento, que meu conceito de felicidade tinha acabado de mudar. Eu já suspeitava que a felicidade com letras maiúsculas não existia, mas dava a ela o benefício da dúvida. Afinal, desde que nos entendemos por gente aprendemos a sonhar com essa felicidade no superlativo.
Mas ali, vendo aquele outdoor estrategicamente colocado no meio do meu caminho (que de certa forma coincidia com o meio da minha trajetória de vida), tive certeza de que a felicidade, ao contrário do que nos ensinaram os contos de fadas e os filmes de Hollywood, não é um estado mágico e duradouro.
Na vida real, o que existe é uma felicidade homeopática, distribuída em conta-gotas. Um pôr-de-sol aqui, um beijo ali, uma xícara de café recém-coado, um livro que a gente não consegue fechar, um homem(mulher) que nos faz sonhar, uma amiga(o) que nos faz rir... São situações e momentos que vamos empilhando com o cuidado e a delicadeza que merecem -alegrias de pequeno e médio porte e até grandes (ainda que fugazes) alegrias.
'Eu contabilizo tudo de bom que me aparece', diz Fabiana, também adepta da felicidade homeopática. 'Se o zíper daquele vestido que eu adoro volta a fechar (ufa!) ou se pego um congestionamento muito menor do que eu esperava, tenho consciência de que são momentos de felicidade e vivo cada segundo.'
Elis conta que cresceu esperando a felicidade com maiúsculas e na primeira pessoa do plural: 'Eu me imaginava sempre com um homem lindo do lado, dizendo que me amava e me levando pra lugares mágicos'. Agora, viajando com freqüência por causa de seu trabalho, ela descobriu que dá pra ser feliz no singular: 'Quando estou na estrada dirigindo e ouvindo as músicas que eu amo, é um momento de pura felicidade. Olho a paisagem, canto -sinto um bem-estar indescritível'.
Uma empresária que conheci recentemente me contou que estava falando e rindo sozinha quando o marido chegou em casa. Assustado, ele perguntou com quem ela estava conversando: 'Comigo mesma', respondeu. 'Adoro conversar com pessoas inteligentes'. Criada para viver grandes momentos, grandes amores e aquela felicidade dos filmes, a empresária trocou os roteiros fantasiosos por prazeres mais simples e aprendeu duas lições básicas: que podemos viver momentos ótimos mesmo não estando acompanhadas e que não tem sentido esperar até que um fato mágico nos faça felizes.
Esperar para ser feliz, aliás, é um esporte que abandonei há tempos. E faz parte da minha 'dieta de felicidade' o uso moderadíssimo da palavra 'quando'.
Aquela história de 'quando eu ganhar na Mega Sena', 'quando eu me casar', 'quando tiver filhos', 'quando meus filhos crescerem', 'quando eu tiver um emprego fabuloso' ou 'quando encontrar um homem(mulher) que me mereça' -tudo isso serve apenas para nos distrair e nos fazer esquecer da felicidade de hoje.
Esperar o príncipe(princesa) encantado, por exemplo -tem coisa mais sem sentido? Mesmo porque quase sempre os súditos são mais interessantes do que os príncipes(princesas).
Como tantos já disseram tantas vezes, aproveitem o momento, amigas(os). E quem for ruim de contas recorra à calculadora para ir somando as pequenas felicidades. Podem até dizer que nos falta ambição, que essa soma de pequenas alegrias é uma operação matemática muito modesta para os nossos tempos.
Que digam. Melhor ser minimamente feliz várias vezes por dia do que viver eternamente em compasso de espera.

Texto: Leila Ferreira, desconheço a fonte.

Carinhosamente enviado pela minha amiga "Luz, Céu e Mar", Lucimar Ferreira, uma pessoa incrível que conheci na NET, e que está sempre de bem com a vida.

terça-feira, 28 de abril de 2009

Doidas e Santas

Es"Estou no começo do meu desespero e só vejo dois caminhos: ou viro doida ou santa". 

São versos de Adélia Prado. Mas vamos lá. Prá começo de conversa, não acredito que haja uma única mulher no mundo que seja santa. Os marmanjos devem estar de cabelo em pé: como assim, e a minha mãe? 
Nem ela, caríssimos, nem ela.
Existe mulher cansada, que é outra coisa. Ela deu tanto azar em suas relações que desanimou. Ela ficou tão sem dinheiro de uns tempos pra cá que deixou de ter vaidade. Ela perdeu tanto a fé em dias melhores que passou a se contentar com dias medíocres. Guardou sua loucura em alguma gaveta e nem lembra mais.
Santa mesmo, só Nossa Senhora, mas cá entre nós, não é uma doideira o modo como ela engravidou? (não se escandalize, não me mande e-mails, estou brin-can-do).
Toda mulher é doida. Impossível não ser. A gente nasce com um dispositivo interno que nos informa desde cedo que, sem amor, a vida não vale a pena ser vivida, e dá-lhe usar nosso poder de sedução para encontrar "the big one", aquele que será inteligente, másculo, se importará com nossos sentimentos e não nos deixará na mão jamais. Uma tarefa que dá para ocupar uma vida, não é mesmo?
Mas além disso temos que ser independentes, bonitas, ter filhos e fingir de vez em quando que somos santas, ajuizadas, responsáveis, e que nunca, mas nunca pensaremos em jogar tudo pro alto e embarcar num navio-pirata comandado pelo Johnny Depp, ou então virar uma cafetina, sei lá, diga aí uma fantasia secreta, sua imaginação deve ser melhor que a minha...
Eu só conheço mulher louca. Pense em qualquer uma que você conhece e me diga se ela não tem ao menos três dessas qualificações: exagerada, dramática, verborrágica, maníaca, fantasiosa, apaixonada, delirante. Pois então. Também é louca. E fascina a todos.
Todas as mulheres estão dispostas a abrir a janela, não importa a idade que tenham. Nossa insanidade tem nome: chama-se Vontade de Viver até a Última Gota.Só as cansadas é que se recusam a levantar da cadeira para ver quem está chamando lá fora.
E santa, fica combinado, não existe. Uma mulher que só reze, que tenha desistido dos prazeres da inquietude, que não deseje mais nada?
Você vai concordar comigo...

Texto: Martha Medeiros
Inagem: óleo sobre tela de Gustav Klimt, "As três idades da Mulher", 1905


sexta-feira, 17 de abril de 2009

Gente Fina

Gente fina, é aquela que é tão especial, que a gente nem percebe, se é gorda, magra, velha, moça, loira, morena, alta ou baixa.

Ela é gente fina, ou seja, está acima, de qualquer classificação.
Todos a querem por perto.
Tem um astral leve, mas sabe aprofundar as questões, quando necessário.É simpática, mas não bobalhona.

É uma pessoa direita, mas não escravizada pelos certos e errados:sabe transgredir, sem agredir.

Gente fina é aquela que é generosa, mas não banana.
Te ajuda, mas, permite que você cresça sozinho.

Gente fina, diz mais sim do que não, e faz isso naturalmente, não é para agradar.

Gente fina, se sente confortável em qualquer ambiente:
num boteco de beira de estrada, e num castelo no interior da Escócia.

Gente fina não julga ninguém - tem opinião, apenas.

"Um novo começo de era, com gente fina, elegante e sincera".
O que mais se pode querer?

Gente fina, não esnoba, não humilha, não trapaceia, não compete e, como o próprio nome diz, não engrossa.
Não veio ao mundo, pra colocar areia, no projeto dos outros.
Ela não pesa, mesmo sendo gorda, e não é leviana, mesmo sendo magra.

Gente fina, é que tinha que virar tendência.
Porque, colocando na balança, é quem faz toda a diferença.


Desconheço a autoria, mas deve ser gente muito fina...

quinta-feira, 26 de março de 2009

NORMOSE (a doença de ser normal)

Todo mundo quer se encaixar num padrão. Só que o padrão propagado não é exatamente fácil de alcançar.
O sujeito"normal" é magro, alegre, belo, sociável, e bem-sucedido. Bebe socialmente, está de bem com a vida, não pode parecer de forma alguma que está passando por algum problema. Quem não se "normaliza", quem não se encaixa nesses padrões, acaba adoecendo. A angústia de não ser o que os outros esperam de nós gera bulimias, depressões, síndromes do pânico e outras manifestações de não enquadramento.
A pergunta a ser feita é: quem espera o quê de nós? Quem são esses ditadores de comportamento que "exercem" tanto poder sobre nossas vidas?
Nenhum João, Zé ou Ana bate à sua porta exigindo que você seja assim ou assado. Quem nos exige é uma coletividade abstrata que ganha "presença" através de modelos de comportamento amplamente divulgados.
A normose não é brincadeira. Ela estimula a inveja, a auto-depreciação e a ânsia de querer ser o que não se precisa ser. Você precisa de quantos pares de sapato? Comparecer em quantas festas por mês? Pesar quantos quilos até o verão chegar?
Então, como aliviar os sintomas desta doença? Um pouco de auto-estima basta. Pense nas pessoas que você mais admira: não são as que seguem todas as regras bovinamente, e sim, aquelas que desenvolveram personalidade própria e arcaram com os riscos de viver uma vida a seu modo. Criaram o seu "normal" e jogaram fora a fórmula, não patentearam, não passaram adiante.
O normal de cada um tem que ser original. Não adianta querer tomar para si as ilusões e desejos dos outros. É fraude. E uma vida fraudulenta faz sofrer demais.
Eu simpatizo cada vez mais com aqueles que lutam para remover obstáculos mentais e emocionais e tentam viver de forma mais íntegra, simples e sincera. Para mim são os verdadeiros normais, porque não conseguem colocar máscaras ou simular situações. Se parecem sofrer, é porque estão sofrendo. E se estão sorrindo, é porque a alma lhes é iluminada.
Por isso divulgue o alerta: a normose está doutrinando erradamente muitos homens e mulheres que poderiam, se quisessem, ser bem mais autênticos e felizes.

Texto: Michel Schimidt, psicoterapeuta

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Afinidade


A afinidade não é o mais importante, mas o mais sutil, delicado e penetrante dos sentimentos. O mais independente.
Não importa o tempo, a ausência, os adiantamentos, as distâncias, as impossibilidades. Quando há afinidade, qualquer reencontro retoma a relação, a conversa, o afeto, no exato ponto em que foi interrompido. Afinidade é não haver tempo mediando a Vida.
É uma vitória do imaginado sobre o real. Do subjetivo sobre o objetivo. Do permanente sobre o passageiro. Do básico sobre o superficial. Ter afinidade é muito raro. Mas quando existe, não necessita de códigos verbais para se manifestar! Existia antes do conhecimento, irradia durante e permanece depois que as pessoas deixaram de estar juntas. O que você tem dificuldade de explicar a um não afim, sai simples e claro diante de alguém com afinidade.
Afinidade é ficar longe pensando parecido a respeito dos mesmos fatos que impressionam, comovem ou mobilizam. É ficar conversando sem trocar palavra. É receber o que vem do outro com aceitação antes do entedimento. Afinidade é sentir com, nem sentir contra, nem sentir para, nem sentir por. Quanta gente ama loucamente, mas sente contra o ser amado. Sentir não é como ter necessidade de explicar o que está sentindo. É olhar e perceber. É mais calor do que falar. É compreender sem ocupar o lugar do outro.
Quem aceita para poder questionar, não nega ao outro a possibilidade de ser o que é, da maneira que é. Isso é afinidade. Pode existir com ou sem amor. Independente dele. A quilômetros de distância. Afinidade é ter perdas semelhantes e iguais esperanças. É retomar a relação do ponto em que parou, sem lamentar o tempo da separação. Porque tempo e separação nunca existiram. Foram apenas as oportunidades dadas (tiradas) pela vida, para que a maturação comum pudesse se dar. Sensível é a afinidade.

Imagem: As Luluzinhas, 48 anos de amizade e afinidades.
Texto: autoria desconhecida, colaboração da "Luluzinha" Tânia M.Hoehne

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

É um Presente Envelhecer

Eu decidi que a velhice é um presente.

Eu sou agora, provavelmente e pela primeira vez em minha vida, a pessoa que eu sempre quis ser. Oh, não meu corpo! Às vezes, eu me aborreço com meu corpo... as rugas, os olhos empapados, e o abdômen caído. Sou surpreendido por aquela pessoa velha que surge em meu espelho, mas eu não ligo e logo parto para outra...

Eu nunca trocaria meus amigos incríveis, minha vida maravilhosa, minha família por menos cabelos grisalhos ou uma barriga mais chata. Quando envelheci, eu me tornei mais amável e menos crítico comigo mesmo. Eu me tornei meu próprio amigo.

Eu não me culpo por comer aquele biscoito extra, ou por não arrumar minha cama, ou por comprar aquela bobagem que eu não vou usar nunca, mas me sinto um vanguardista em meu meio. Eu considero o máximo estar à vontade, ser extravagante.

Eu vi muitos queridos amigos deixarem este mundo muito cedo, antes de eles entenderem a grande liberdade que vem com o envelhecer.

Quem pode me repreender se eu escolher ler ou jogar no computador até as 4 da manhã ou dormir até o meio-dia?

Sozinho, eu posso dançar as melodias maravilhosas dos anos 60 e70, e posso também lamentar um amor perdido, se quero...

Posso ir à praia e nadar de terno, ficar todo encharcado, e mergulhar nas ondas com o abandono que eu decidir, apesar dos olhares contestadores... Eles, também, envelhecerão.

Eu sei que, às vezes, eu me esqueço. Mas, novamente, há coisas na vida que é bom esquecer. E, às vezes, eu me lembro das coisas importantes.

Seguramente, durante anos meu coração esteve magoado. Como um coração pode não chorar quando perde um ser amado, ou quando vê uma criança sofrer, ou até mesmo quando alguém amado sofre um acidente? Mas, as mágoas do coração nos dão força e nos ensinam a compaixão. Um coração que nunca sofreu é rude e estéril, e nunca saberá a alegria de não ser magoado.

Eu sou abençoado por ter vivido tempo bastante para ter cabelos grisalhos e ter meu sorriso jovem, marcando profundamente a minha face. Tantos nunca sorriram e tantos morreram ntes de seus cabelos se tornarem prata.

Quando você envelhece, é mais fácil ser positivo. Você se preocupa menos com que as outras pessoas pensam. Eu não me questiono mais. Eu ganhei, até mesmo, o direito de estar errado.

Assim, respondo sua pergunta, eu gosto de ser velho. Tornou-me livre. Eu gosto da pessoa em que eu me tornei. Eu não vou viver para sempre, mas enquanto eu aqui estiver eu não desperdiçarei meu tempo, lamentando o que poderia ter sido, ou me preocupando sobre o que será. E, eu comerei sobremesa todos os dias, se assim quiser!

Desconheço a autoria do texto.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Os Limites do Capital são os Limites da Terra


Em 1961 precisávamos de metade da Terra para atender as demandas humanas. Em 1981 empatávamos: precisávamos de um Terra inteira. Em 1995 já ultrapassamos em 10% de sua capacidade de regeneração, mas era ainda suportável. Em 2008 passamos de 40% e a Terra está dando sinais inequívocos de que já não agüenta mais. Se mantivermos o crescimento do PIB mundial entre 2-3% ao ano, em 2050 vamos precisar de duas Terras, o que é impossível. A análise é de Leornado Boff, em seu artigo de estréia como colunista da Carta Maior.

" Uma semana após o estouro da bolha econômico-financeira, no dia 23 de setembro, ocorreu o assim chamado Earth Overshoot Day , quer dizer, “o dia da ultrapassagem da Terra”. Grandes institutos que acompanham sistematicamente o estado da Terra anunciaram: a partir deste dia o consumo da humanidade ultrapassou em 40% a capacidade de suporte e regeneração do sistema-Terra.

Traduzindo: a humanidade está consumindo um planeta inteiro e mais 40% dele que não existe. O resultado é a manifestação insofismável da insustentabilidade global da Terra e do sistema de produção e consumo imperante.

Entramos no vermelho e assim não poderemos continuar porque não temos mais fundos para cobrir nossas dívidas ecológicas. Esta notícia, alarmante e ameaçadora, ganhou apenas algumas linhas na parte internacional dos jornais, ao contrário da outra que até hoje ocupa as manchetes dos meios de comunicação e os principais noticiários de televisão.

Lógico, nem poderia ser diferente. O que estrutura as sociedades mundiais, como há muitos anos o analisou Polaniy em seu famoso livro A Grande Transformação, não é nem a política nem a ética e muito menos a ecologia, mas unicamente a economia. Tudo virou mercadoria, inclusive a própria Terra. E a economia submeteu a si a política e mandou para o limbo a ética.

Até hoje somos castigados dia a dia a ler mais e mais relatórios e análises da crise econômico-financeira como se somente ela constituisse a realidade realmente existente. Tudo o mais é secundarizado ou silenciado.

A discussão dominante se restringe a esta questão: que correções importa fazer para salvar o capitalismo e regular os mercados? Assim poderíamos continuar as usual a fazer nossos negócios dentro da lógica própria do capital que é: quanto posso ganhar com o menor investimento possível, no lapso de tempo mais curto e com mais chances de aumentar o meu poder de competição e de acumulação?

Tudo isso tem um preço: a delapidação da natureza e o esquecimento da solidariedade generacional para com os que virão depois de nós. Eles precisam também satisfazer suas necessidades e habitar um planeta minimamente saudável.

Mas esta não é a preocupação nem o discurso dos principais atores econômicos mundiais mesmo da maioria dos Estados, como o brasileiro que, nesta questão, é administrado por analfabetos ecológicos. Poucos são os que colocam a questão axial: afinal se trata de salvar o sistema ou resolver os problemas da humanidade?

Esta é constituída em grande parte por sobreviventes de uma tribulação que não conhece pausa nem fim, provocada exatamente por um sistema econômico e por políticas que beneficiam apenas 20% da humanidade, deixando os demais 80% a comer migalhas ou entregues à sua própria sorte.

Curiosamente, as vitimas que são a maioria sequer estão presentes ou representadas nos foros em que se discute o caos econômico atual. E pour cause, para o mercado são tidos como zeros econômicos, pois o que produzem e o que consomem é irrelevante para contabilidade geral do sistema.

A crise atual constitui uma oportunidade única de a humanidade parar, pensar, ver onde se cometeram erros, como evitá-los e que rumos novos devemos conjuntamente construir para sair da crise, preservar a natureza e projetar um horizonte de esperança, promissor para toda a comunidade de vida, incluídas as pessoas humanas.

Trata-se sem mais nem menos de articular um novo padrão de produção e de consumo com uma repartição mais equânime dos benefícios naturais e tecnológicos, respeitando a capacidade de suporte de cada ecosistema, do conjunto do sistema-Terra e vivendo em harmonia com a natureza.

Milkahil Gorbachev, presidente da Cruz Verde Internacional e um dos principais animadores da Carta da Terra, grupo o qual pertenço, advertiu recentemente: Precisamos de um novo paradigma de civilização porque o atual chegou ao seu fim e exauriu suas possibilidades. Temos que chegar a um consenso sobre novos valores.

Em 30 ou 40 anos a Terra poderá existir sem nós. A busca de um novo paradigma civilizatório é condição de nossa sobrevivência como espécie. Assim como está não podemos continuar.

Na última página de seu livro A era dos extremos diz enfaticamente Eric Hobsbawm: Nosso mundo corre o risco de explosão e de implosão. Tem de mudar. E o preço do fracasso, ou seja, a alternativa para a mudança da sociedade é a escuridão.

Importa entender que estamos enredados em quatro grandes crises: duas conjunturais – a econômica e a alimentar – e duas estruturais – a energética e a climática. Todas elas estão interligadas e a solução deve ser includente.

Não dá para se ater apenas à questão econômica, como é predominante nos debates atuais. Deve-se começar pelas crises estruturais, pois que se não forem bem encaminhadas, tornarão insustentáveis todas as demais.

As crises estruturais, portanto, são as que mais atenção merecem. A crise energética revela que a matriz baseada na energia fóssil que movimenta 80% da máquina produtiva mundial tem dias contados.

Ou inventamos energias alternativas ou entraremos em poucos anos num incomensurável colapso. A crise climática possui traços de tragédia. Não estamos indo ao encontro dela. Já estamos dentro dela. A Terra já começou a se aquecer. A roda começou a girar e nao há mais como pará-la, apenas diminuir sua velocidade ao minimizar seus efeitos catastróficos e ao adaptar-se a ela. Bilhões e bilhões de dólares devem ser investidos anualmente para estabilizar o clima entorno de 2 a 3 graus Celsius já que seu aquecimento poderá ficar entre 1,6 a 6 graus, o que poderia configurar uma devastação gigantesca da biodiversidade e o holocausto de milhões de seres humanos. De todas as formas, mesmo mitigado, este aquecimento vai produzir transtornos significativos no equilíbrio climático da Terra e provocar nos próximos anos cerca de 150-200 milhões de refugiados climáticos segundo dados fornecidos pelo atual Presidente da Assembléia Geral da ONU, Miguel d’Escoto, em seu discurso inaugural em meados de outubro de 2008. E estes dificilmente aceitarão o veredito de morte sobre suas vidas. Romperão fronteiras nacionais, desestabilizando politicamente muitas nações. Estas duas crises estruturais vão inviabilizar o projeto do capital. Ele partia do falso pressuposto de que a Terra é uma espécie de baú do qual podemos tirar recursos indefinidamente.

Hoje ficou claro que a Terra é um planeta pequeno, velho e limitado que não suporta um projeto de exploração ilimitada...

Em 1961 precisávamos de metade da Terra para atender as demandas humanas. Em 1981 empatávamos: precisávamos de uma Terra inteira. Em 1995 já ultrapassamos em 10% de sua capacidade de regeneração, mas era ainda suportável. Em 2008 passamos de 40% e a Terra está dando sinais inequívocos de que já não agüenta mais. Se mantivermos o crescimento do PIB mundial entre 2-3% ao ano, em 2050 vamos precisar de duas Terras, o que é impossível. Mas não chegaremos lá.

Resta ainda lembrar que entre 1900 quando a humanidade tinha 1,6 bilhões de habitantes e 2008 com 6,7 bilhões, o consumo aumentou 16 vezes. Se os países ricos quisessem generalizar para toda a humanidade o seu bem-estar - cálculos já foram feitos - iríamos precisar de duas Terras iguais a nossa.

A crise de 1929 dava por descontada a sustentabilidade da Terra. A nossa não pode mais contar com este fato e com a abundancia dos recursos naturais. Nenhuma solução meramente econômica da crise pode suprir este déficit da Terra.

Não considerar este dado torna a análise manca naquilo que é a determinação fundamental e a nova centralidade. Tudo isso nos convence de que a crise do capital não é crise cíclica. É crise terminal.

Em 300 anos de hegemonia praticamente mundial, esse modo de produção com sua expressão política, o liberalismo, destruiu com sua voracidade desenfreada, as bases que o sustentam: a força de trabalho, substituindo-a pela máquina e a natureza devastando-a a ponto de ela não conseguir, sozinha, se auto-regenerar. Por mais estragemas que seus ideólogos vindos da tradição marxiana, keneysiana ou outras tentem inventar saídas para este corpo moribundo, elas não serão capazes de reanimá-lo. Suas dores não são de parto de um novo ser, mas dores de um moribundo. Ele não morrerá nem hoje nem amanhã. Possui capacidade de prolongar sua agonia, mas esgotou sua virtualidade de nos oferecer um futuro discernível. Quem o está matando não somos nós, já que não nos cabe matá-lo, mas superá-lo, na boa tradição marxiana bem lembrada por Chico Oliveira em sua lúcida entrevista, mas a própria natureza e a Terra.

Repetimos: os limites do capitalismo são os limites da Terra. Já encostamos nestes limites tanto da Terra quanto do capitalismo. A continuar seremos destruídos por Gaia, pois ela, no processo evolucionário, sempre elimina aquelas espécies que de forma persistente e continuada ameaçam a todas as demais. Nós, homo sapiens e demens, nos fizemos, na dura expressão do grande biólogo E. Wilson, o Satã da Terra, quando nossa vocação era o de sermos seu cuidador, guardião e anjo bom. Para onde iremos? Nem o Papa nem o Dalai Lama, nem Barack Obama nem muito menos os economistas nos poderão apontar uma solução. Mas pelo menos podemos indicar uma direção.

Se esta estiver certa, o caminho poderá fazer curvas, subir e descer e até conhecer atalhos, esta direção nos levará a uma terra na qual os seres humanos podem ainda viver humananente e tratar com cuidado, com compaixão e com amor a Terra, Pacha Mama, Nana e nossa Grande Mãe. Esta direção, como tantos outros já o assinalaram, se assenta nestes cinco eixos: (1) um uso sustentável, responsável e solidário dos limitados recursos e serviços da natureza; (2) o valor de uso dos bens deve ter prioridade sobre seu valor de troca; (3) um controle democrático deve ser construído nas relações sociais, especialmente sobre os mercados e os capitais especulativos; (4) o ethos mínimo mundial deve nascer do intercâmbio multicultural, dando ênfase à ética do cuidado, da compaixão, da cooperação e da responsabilidade universal; (5) a espiritualidade, como expressão da singularidade humana e não como monopólio das religiões, deve ser incentivada como uma espécie de aura benfazeja que acompanha a trajetória humana, pois ancora o ser humano e a história numa dimensão para além do espaço e do tempo, conferindo sentido à nossa curta passagem por este pequeno planeta.

Devemos crer, como nos ensinam os cosmólogos contemporâneos, nas virtualidades escondidas naquela Energia de fundo da qual tudo provém, que sustenta o universo, que atua por detrás de cada ser e que subjaz a todos os eventos históricos e que permite emergências surpreendentes.

É do caos que nasce a nova ordem. Devemos fazer de tudo para que o atual caos não seja destrutivo mas criativo. Então sobrevivemos com o mesmo destino da Terra, a única casa comum que temos para morar."

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

A FLORA que amanos odiar


Os psicopatas são os novos heróis do cinema e da tevê

A extrema maldade de Flora na novela A Favorita nos faz indignados e fascinados. Patrícia Pilar está dando um show, como também Glória Pires fez no passado com Maria de Fátima em Vale Tudo, que iniciou a leitura da psicopatia brasileira. Ela está em toda parte, na política principalmente, na busca louca do sucesso, na fuga do anonimato e em
sua decorrência: o crime.

Antigamente, nos romances e filmes, nos identificávamos com as vítimas; hoje, nos fascinamos com os vilões. Não torcermos mais pelos mocinhos - torcemos pelos bandidos. Por que? Bem, porque os psicopatas são o nosso futuro, a vida moderna nos levará a isso. Pensem no último Coringa, do Batman, interpretado pelo falecido Heath Ledger.

Diante dos cadáveres, da miséria, do cinismo, somos levados a endurecer o coração, endurecer os olhos, a ser cínicos em busca de um funcionamento comercial. Do contrário, seremos descartados, tirados de linha como um carro velho.

A sociedade está parindo legiões de psicopatas, muitos disfarçados de chiques ou light. Nem todo psicopata esquarteja mulheres no parque. O livro Mentes Perigosas, da psiquiatra Ana Beatriiz B. Silva, nos dá medo: a cada 25 pessoas, uma é psicopata. Podem passar a vida toda tranquilamente, prejudicando os outros, sem nunca serem descobertas.

O psicopata light, que não faz picadinho de ninguém, tem as mesmas molas que movem o esquartejador. Ele parece muito sadio e simpático. Não é nervoso nem inseguro. Tem encanto e inteligência; sem afetividade ou culpa para atrapalhar, tem uma espantosa capacidade de manipulação dos outros, pela mentira, sedução e, se precisar, pela chantagem.

Questionado ou flagrado, o psicopata sempre se acha inocente ou vítima do mundo, do qual tem de se vingar. Ele, em geral, não delira. Suas ações mais absurdas e crueis são justificadas como lógicas, naturais, já que o outro não existe. Não sente nem remorso nem vergonha do que faz (o que nos dá uma secreta inveja). Ele mente compulsivamente, muitas vezes acreditando na própria mentira, para conseguir poder. Seu fraco amor aparece apenas como posse ou controle. Não olha para dentro de si, nem aprende com a experiência, simplesmente porque acha que não tem nada a aprender.

O psicopata não deprime. Ele atua e pode fazer muito sucesso num mundo onde a alegria falsa e maníaca é obrigatória. Estes tempos de alegria obrigatória são sopa no mel para os psicopatas, os chamados psicóticos sãos como os nomeiam alguns psicanalistas hoje.

Hoje em dia é proibido sofrer. Temos de funcionar, temos de rir, de gozar, de ser belos, magros, chiques, tesudos, em suma, temos de ser uma mímica dos produtos de qualidade total. Para isso, há o Prozac, o Viagra, os uppers, os downers; senão, nos encostam como arcaicos. "A depressão não é comercial", disse-me uma bichinha chorando, um costureiro à beira do suicídio que tinha de sorrir sempre, para as freguesas, para as fotos, senão perdia a clientela e a fama.

No entanto, a depressão importa. A melancolia é fundamental para a criação e para a felicidade. Estamos erradicando uma força cultural brutal, a musa por trás de muita arte, poesia e música. Estamos aniquilando a melancolia.

Há uma nova ciência, a ciência da felicidade. Parece realmente ser uma era de perfeito contentamento, um grande mundo novo de sorte persistente, alegria sem problemas, felicidade sem penas. Mas sem um desencanto com o sentido da vida, sem um ceticismo crítico, sem a morte no pensamento, ninguém chega a uma reflexão decente.

A melancolia, longe de ser uma mera doença ou fraqueza de espírito, é quase um convite milagroso para transcender
este status quo banal e imaginar as inimagináveis possibilidades de existência. Sem melancolia, a Terra iria provavelmente se congelar num estado fixo, tão previsível como o metal. Só com a ajuda da angústia constante este mundo à beira da morte pode ser transformado, reavivado, levado ao novo.

Quando nós, com aparente felicidade, nos seguramos numa ideologia qualquer, este mundo subitamente parece entrar numa coerência estática, uma divisão rígida entre o certo e o errado. O mundo, dessa forma, torna-se desinteressante, morto.

No Brasil, com a crise das utopias e com a exposição brutal de um escândalo por dia, com a propaganda estimulando a ridícula liberdade para irrelevâncias, temos o indivíduo absolutamente sozinho. Isso leva a um narcisismo desabrido, base da psicopatia. Somos hoje sem limites morais em luta por um lugar ao sol. Ou pela fama ou por um golpe na praça. Queremos ser ricos ou famosos. A sobrevivência moderna precisa do crime, cada vez mais.

E esse comportamento está deixando de ser uma exceção. O psicopata é um prenúncio do futuro, quando todos seremos assim para sobreviver. A velha luta pela ética, pela paz, pela solidariedade está virando uma batalha vã. Esses sentimentos humanos só foram possíveis historicamente. Raros foram os momentos em que vicejaram. Os chamados comportamentos humanos estão se esvaindo na distância. O que é o humano hoje? O humano está virando apenas um lugar-comum para uma bondadezinha submissa, politicamente correta. O humano é histórico também. Talvez não haja mais lugar para esse conceito, que é mutante. Somos máquinas desejantes que nos transformamos com o tempo e a necessidade.

Antes, os psicopatas tocavam num mistério que não queríamos conhecer. Tínhamos medo deles. Hoje, temos de competir com os psicopatas, que em geral nos vencem, com sua eficiência, rapidez e falta de escrúpulos. Estamos vendo que essa antiga doença vai acabar virando uma virtude no futuro.

Ficou arcaica a idéia de compaixão e um dia seremos tocados pela graça da insensibilidade. Como os psicopatas. Temos de esfriar o coração para viver no Brasil. Por enquanto ainda falamos Que horror!, mas um dia chegaremos a um coração perfeitamente frio. Um dia seremos todos psicopatas.


Texto: Arnaldo Jabor

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

A importância de perder peso


Vou ao supermercado e constato o crescimento do setor de dietéticos. Abro revistas e me deparo com as exigências de se ter um corpo esbelto. As clínicas de cirurgia plástica estão com a agenda lotada de homens e mulheres esperando sua vez para lipoaspirar, cortar, reduzir. A sociedade toda conspira a favor da magreza, e de certo modo isso é positivo, ser magro faz bem para a auto-estima e para a saúde. Mas não tenho visto ninguém estimular outro tipo de dieta igualmente necessária para o bem-estar da população. Encontro suco light, chocolate light, iogurte light, mas pessoas light são raridade.

Muita gente se preocupa em ser magro, mas não se preocupa em ser leve. Tem criatura aí pesando 48 quilos e que é um chumbo. São aqueles que vivem se queixando. Possuem complexo de perseguição, acham que o planeta inteiro está contra eles. Não se dão conta da sua arrogância, possuem certeza de que são a razão da existência do universo. Estão sempre dispostos a fazer uma piadinha maldosa, uma fofoquinha desabonadora sobre alguém. Ressentidos, puxam o tapete dos outros para se manter em pé. Não conseguem ver graça em nada, não relevam as chatices comuns do dia-a-dia, levam tudo demasiadamente a sério. São patrulhadores, censores, carregam as dores do mundo nas costas. Magrinhos, é verdade. Mas que gente pesada.

Ser minimalista todo mundo acha moderno, mas ser leve — cruzes! — parece pecado mortal. Os leves, segundo os pesados, não têm substância, não têm profundidade, não têm consistência intelectual: não são leves e, sim, levianos. Os pesados não conseguem fechar o zíper das suas roupas de tanto preconceito saltando pra fora.

Não bastasse a carga tributária, a violência, a burocracia e a corrupção, ainda temos que enfrentar pessoas rudes, sem a menor vocação para se divertir. Diversão — segundo os pesados, mais uma vez — é algo alienante e sem serventia. Eles não entendem como alguém pode extrair prazer de coisas sérias como o trabalho e a família. Não entendem como é que tem gente que consegue viver sem armar barracos e criar problemas.

Eu proponho uma campanha de saúde pública: vamos ser mais bem-humorados, mais desarmados. Podemos ser cidadãos sérios e respeitáveis e, ao mesmo tempo, leves. Basta agir com mais delicadeza, soltura, autenticidade, sem obediência cega às convenções, aos padrões, aos patrões. Um pouco mais de jogo de cintura, de criatividade, de respeito às escolhas alheias. Vamos deixar para sofrer pelo que é realmente trágico e não por aquilo que é apenas um incômodo, senão fica impraticável atravessar os dias.

Dores de amor, falta de grana e angústias existenciais são contingências da vida, mas você não precisa soterrar os outros com seus lamentos e más vibrações. Sustente seu próprio fardo e esforce-se para aliviá-lo. Emagreça onde tem que emagrecer: no espírito, no humor. E coma de tudo, se isso ajudar.
Feliz 2009!

Texto: Martha Medeiros

quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Faça Novo o teu Ano


Neste ano novo, faça-te novo, reduzas a tua ansiedade, cultivas flores no canteiro da alma, regues de ternura teus sentimentos mais profundos, imprimas a teus passos o ritmo das tartarugas e a leveza das garças.

Não te mires nos outros; a inveja é um cancro que mina a auto-estima, fomenta a revolta e abre, no centro do coração, o buraco no qual se precipita o próprio invejoso. Mira-te em ti mesmo, assumas teus talentos, acredites em tua criatividade, abrace com amor tua singularidade. Evitas, porém, o olhar narciso. Sejas solidário; aos estender aos outros as tuas mãos estarás oxigenando a própria vida. Não seja refém de teu egoísmo.

Cuida-te da língua. Não professes difamações e injúrias. O ódio destrói quem odeia, não o odiado. Troque a maledicência pela benevolência. Comprometa-te a expressar ao menos cinco elogios por dia. Tua saúde espiritual agradecerá.

Não desperdices tua existência hipnotizado pela TV ou navegando aleatoriamente pela internet, naufragado no turbilhão de imagens e informações que não consegues transformar em síntese cognitiva. Não deixes que a espetacularização da mídia anule tua capacidade de sonhar e te transforme em consumista compulsivo. A publicidade sugere felicidade e, no entanto, nada oferece senão prazeres momentâneos.

Centra tua vida em bens infinitos, nunca nos finitos. Leia muito, reflitas, ouse buscar o silêncio neste mundo ruidoso. Lá encontrarás a ti mesmo e, com certeza, um Outro que vive em ti e quase nunca é escutado.

Cuida da saúde, mas sem a obsessão dos anoréticos e a compulsão dos que devoram alimentos com os olhos. Caminhas, pratiques exercícios aeróbicos, sem descuidar de acarinhar tuas rugas e não temer as marcas do tempo em teu corpo. Freqüentes também uma academia de malhar o espírito. E passe nele os cremes revitalizadores da generosidade e da compaixão.

Não dês importância ao que é fugaz, nem confundas o urgente com o prioritário. Não te deixes guiar pelos modismos. Faças como Sócrates, observe quantas coisas são oferecidas nas lojas que tu não precisas para ser feliz. Jamais deixes passar um dia sem um momento de oração. Se não tens fé, mergulha-te em tua vida interior, ainda que por apenas cinco minutos.

Não te deixes desiludir pelo mundo que o cerca. Assim o fizeram seres semelhantes a nós. Saibas que és chamado a transformá-lo. Se tens nojo da política, receberas a gratidão dos políticos que a enojam. Se és indiferente, agradecerão os que a ela se apegam. Se reages e atuas, haverão de temer-te, porém a democracia se fará mais participativa.

Arranque de tua mente todos os preconceitos e, de tuas atitudes, todas as discriminações. Sê tolerante, coloca-te no lugar do outro. Todo ser humano é o centro do Universo e morada viva de Deus. Antes, indagues a ti mesmo por que provocas em outrem antipatia, rejeição, desgosto. Reveste-te de alegria e descontração. A vida é breve e, de definitivo, só conhece a morte.

Faça algo para preservar o meio ambiente, despoluir o ar e a água, reduzir o aquecimento global. Não utilizes material não-biodegradável. Trate a natureza como aquilo que ela é de fato: tua mãe. Dela viestes e a ela voltarás; hoje, vives do beijo que lhe dá continuamente na boca: ela te nutre de oxigênio e alimentos.

Guarde um espaço em teu dia-a-dia para conectar-te com o Transcendente. Deixas que Deus acampe em tua subjetividade. Aprendas a fechar os olhos para ver melhor.

Feliz 2009!

Texto: Frei Beto

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Eu desejo, pra mim e pra você!


Queria ser uma fada madrinha, daquelas bem poderosas

Sempre gostei da imagem das fadas, principalmente as animadas, dos filmes infantis, aquelas gordinhas que aparecem dando poderes aos róseos bebês dos reis e rainhas bons, em seus berços de ouro, às vezes três, juntinhas, risonhas, cada uma com um vestidinho de uma cor. Amarelinho, rosinha, azulzinho, com pequenas variações, e sempre sacudindo uma varinha nas mãos, e dando ordens numa língua pirlimpimpim, cheia de brilhos. Sou doida pela Sininho, a fadinha do Peter Pan, eternamente apaixonada, muito louca com seus pózinhos e suas sacanagens de mini-mulher-libélula ciumenta do garoto que não quer crescer. Sininho, sempre em dúvida entre o grande gancho do Capitão e o menino. Cresci com essas imagens, invocando-as sempre que gostaria de poder fazer algo para alguém, imediatamente. Sempre funcionou.

Então, agora, me concentro, mas sozinha, sem varinha, uma pena, se é que me entendem. Mas querendo, de coração, ser atendida. Eu desejo que agora em 2009 você consiga ser feliz, muito feliz. Tenha tudo do que precisa para viver e não morrer e não sofrer. Não tenha que depender de ninguém com quem não poderá contar. Que os segundos, minutos, dias, meses, passem suaves, inclusive em seu corpo, rejuvenescendo-o. Que a água que você beba seja da Fonte da Juventude. Que seus passos sejam firmes, em direção ao futuro, ao progresso e ao Bem. Que sua voz soe suave para quem ama; e temível, muito temida, pelos seus inimigos. Que seus olhos enxerguem muito além do horizonte. Que seus ouvidos sejam sensíveis o bastante para ouvir as tramóias sussurradas às suas costas, e que estas estejam sempre protegidas, blindadas, intransponíveis.

Quero que você não sofra desilusões pessoais, e que não te traiam, nem a confiança. Quero que mantenha o amor que encontrou, ou encontre o amor que tudo fará para manter, sob a luz da Lua, e que esta a todos enamore. E que o Sol nasça para todos, mesmo que se impondo em quadrados de quartos ou prisões. Que sempre haja a sombra da copa de uma árvore para seu abrigo e um canto seguro onde possa guardar seus segredos mais íntimos. E os que lhe confiarem.

Quero ver você dançar a dança da sua música, com alegria em cada passo, em cada ritmo, e sempre música boa, de alma. Quero ver você lamber os beiços saboreando o brigadeiro, o doce-de-leite, o quindim ou o pão de queijo quente, e os dedos lambuzados da forma roubada da massa que ainda vai virar bolo. Nada disso lhe fará mal, ou engordará. Que você dê gargalhadas diante de um milk-shake de chocolate, e com o barulhinho do canudinho puxado no fundo, na raspa da taça.

Que você ande quilômetros, firme, altivo, e que seus sapatos jamais fiquem apertados ou calejem seus pés, nem nos saltos altos, nem nas sandálias, que nem sempre são de humildade. Que nem calcinhas, nem cuecas, nem gravatas, nem soutiens te apertem, saiam do lugar, que essas coisas nunca te incomodem.

Que você vá a muitas festas, e que nelas faça a diferença, sendo notado no que há de melhor, mais belo, não nos erros procurados sempre pelos olhares maldosos. Que a fada te livre desses olhos gordos, maus, invejosos. E que você possa sempre respirar o ar das montanhas, puro, mesmo que daquele ar condicionado com que tem de conviver. Que você descubra um passatempo só seu para o trânsito não irritar, e que você vá e volte, livre, para o conforto e aconchego de seu lar. Que seu travesseiro o acolha, abrace e o aconselhe bem a cada noite. Nas manhãs, que o canto mais belo dos pássaros seja seu despertador. E, claro, que as flores mais lindas e coloridas nasçam nos jardins que tocar.

Eu desejo desde já muita sorte. Na loteria. Na vida. No amor. Nas escolhas. Que a fada do banco baixe os juros do seu cheque especial, reparta sua dívida, e tudo sem você implorar ao gerente. Que seu emprego, suas rendas, seu salário sejam mantidos, preservados, em dia. Que jamais tentem te fazer de relógio, mas que sobrem sempre muitas horas para você dedicar, solidário, ao seu próximo.

Como fada madrinha, gostaria ainda que você habitasse um mundo justo, democrático, onde as leis existam para ser cumpridas, e onde a liberdade de seu pensamento, religião e expressão, por mais diversificada que possa ser, mereça respeito em seu redor, seja ele a favela, a casa, a casinha, o sobrado, a mansão, a cidade, a cidadinha, a metrópole ou megalópole. Que não tentem enganá-lo, roubá-lo, iludi-lo. Que consigamos todos nos livrar do Mal.

De minha parte, já vejo tudo assim, real, acontecendo. E espero que você me retribua sempre apenas com a generosidade de sua leitura, com o carinho de sua lembrança.

Texto: Marli Gonçalves, jornalista, cheia de desejos e vontades. Sem pó de pirlimpimpim. Tem uma caixinha de Pandora, de bondades. Mas também tem arco, flecha, tacape e pintura de guerra para quem mexe com sua tribo. http://www.ucho.info/marli_goncalves.htm

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Seres de Luz


A luz constitui um dos maiores mistérios do universo. Somente entendendo-a ao mesmo tempo como partícula material e como onda energética podemos ter uma compreensão mais ou menos adequada dela. Hoje sabemos que todos os seres vivos emitem luz, biofotons, a partir das células da DNA. Por isso todos irradiam certa aura.
Não é sem razão que a luz e o sol se tornaram símbolos poderosos de tudo o que é positivo e vital. Especialmente o sol irradiante é visto como o grande arquétipo do herói e do lutador que vence as trevas com os monstros que nelas eventualmente se escondem. Sua aparição a cada manhã não é uma repetição, mas toda vez uma novidade, pois é sempre diferente. É um teatro cósmico que começa da cappo, como se Deus dissesse ao sol a cada manhã:“Vamos, tente mais uma vez! Renove teu nascimento! Irradie tua luz em todas as direções e sobre todos”.
Na maioria dos povos havia o temor de que o sol talvez pudesse ser tragado pelas trevas e não voltasse mais a nascer e a iluminar a Terra e a cada um de nós. Criaram-se rituais e festas que celebravam a vitória do Sol sobre as trevas. Assim, havia a festa romana do Sol Invictus, do “Sol Invencível”. Posteriormente, deu origem ao Natal cristão, a festa do nascimento do Deus encarnado , chamado de “o Sol da Justiça”. As festas juninas com suas fogueiras têm por detrás a experiência do sol, pois se inaugura o solstício de inverno.
Fazia-se e faz-se ainda hoje a impressionante experiência de que o Sol com seus raios de luz, nasce como uma criança. Na medida em que sobe no firmamento, vai crescendo como um adolescente até chegar à idade adulta ao meio-dia. Pela tarde vai definhando até ficar velho e morrer atrás da linha do horizonte. Mas, passada a noite, ele volta a nascer, limpo, brilhante, sorridente como uma criança. Como não celebrá-lo festivamente? Como não entendê-lo como sinal da Realidade originadora de todas as coisas?
De fato, ele é uma imagem poderosa de Deus como o cantou São Francisco em seu “Cântico ao Irmão Sol”. Nenhuma metáfora da divindade é mais poderosa que a da luz e a do Sol. A própria experiência da luz fez surgir a palavra Deus. Ela deriva de di em sânscrito que signfica brilhar e iluminar. De di veio “dia” e “Deus”, como expressão de uma experiência de luz e de iluminação. Como diz São João: ”Deus é luz” (1Jo 1,5). “Ele habita”, no dizer de São Paulo “numa luz inacessível”(1Tim 6,16). Jesus se auto-apresenta como luz: “Eu, a luz, vim ao mundo para que todo aquele que crê não ande nas trevas”(Jo 12,46) O Verbo encarnado é “vida e luz dos homens”, “luz verdadeira que ilumina todo o ser humano que vem a este mundo”(Jo 1.4.9). Por isso é com razão apresentado como “a luz do mundo”(Jo 9,5). Os que aderem a Cristo como luz devem viver “como filhos da luz”(Ef 5,8). E “os frutos da luz é tudo o que é bom, justo e verdadeiro”(Ef 5,9). Mais ainda. Cada seguidor deve ser também “luz do mundo”(Mt 5,14).
Como reza tão bem a liturgia dos funerais:”Que as almas do fiéis defuntos não tombem nas trevas, mas que o arcanjo São Miguel, as introduza na luz santa. Faça brilhar sobre eles a luz perpétua”.
Nós todos somos seres de luz. Fomos formados originalmente no coração das grandes estrelas vermelhas, há bilhões de anos. Carregamos luz dentro de nós, no corpo, no coração e na mente. Especialmente a luz da mente nos permite compreender os processos da natureza e penetrar no íntimo das pessoas até no mistério luminoso de Deus.
Texto de Leonardo Boff


QUE O PAI NOS ILUMINE,
AUMENTANDO NOSSO BRILHO,
IRRADIANDO-O PARA TODA A HUMANIDADE.

SÃO NOSSOS VOTOS PARA ESTE NATAL E 2009!

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Nossos Desejos neste Dezembro para Você!


"Apaixone-se
Sempre que um novo dia amanhece e os nossos sentidos buscam captar as belezas que nos cercam, temos vontade de abrir as janelas da alma e inspirar com força a brisa fresca que brinca com a folhagem verde.
Sempre que um novo ano se apresenta fazemos planos para novas realizações.
No entanto, muitos não abriram os olhos físicos para saudar o ano que se inicia ou termina, nem para contemplar o alvorecer do dia de hoje ou despedir-se do sol, quando o crepúsculo enfeita a noite com seu manto negro bordado de estrelas...
Mas você está vivo!
E quando muitos não percebem sequer os canteiros floridos onde as borboletas bailam e o gramado se espreguiça, estendido como um tapete verde e macio, convidando a brincar...
E enquanto outros saem apressados para suas atividades do dia, sem se dar conta de que hoje é o nosso melhor momento, um poeta se deteve para escrever este belo conselho em forma de poema:
Apaixone-se pelo mistério que nos cerca, pelo ar que você respira, pelas árvores e pelas estrelas.
Olhe com atenção para as flores. A visão é antes uma ação do cérebro que dos olhos.
Ouça o vento nas folhas, o canto dos pássaros e o tagarelar das crianças.
O ouvir é uma arte que depende mais da mente que do ouvido. Olhos e ouvidos são canais fantásticos que levam mensagens até você; eles serão inúteis se, em sua alma, não habitar a vontade de ver e de ouvir.
Apaixone-se por sua capacidade de se auto-transformar para melhor. Você é um pouco Deus na exata medida em que pode, por sua própria vontade e determinação, construir uma pessoa melhor.
O caminho da perfeição é infinito, mas cada passo nesta estrada é fonte cristalina de pura felicidade.
Ninguém é tão miserável que não possa dar um primeiro passo na direção certa, assim como ninguém é tão perfeito que já não precise caminhar.
Apaixone-se pelo saber, devore livros, raciocine, converse com pessoas inteligentes, ouça boas músicas, olhe com atenção para as obras de arte.
Os artistas, os filósofos, os poetas, os cientistas vêem, ouvem e sentem mais que a maioria dos homens, e é mister aprender com eles.
Pergunte, discuta, descubra, polemize, investigue, faça experiências.
Dê o melhor de seu esforço em tudo o que faz. Ajude seu próximo e sua comunidade e descobrirá o verdadeiro significado das palavras “é dando que se recebe”.
Receberá em moeda divina, receberá em dignidade, sensibilidade, grandeza de espírito e amor-próprio.
Trabalhe com o cérebro e com as mãos. Transforme o mundo em um lugar melhor para se viver.
Não polua, proteja a natureza, conserte sua calçada, plante flores em sua casa e em sua rua.
Lembre-se sempre de que cada atitude sua, cada movimento seu, será sempre na direção do bem ou do mal. Seu, de seus semelhantes ou de seu mundo.
Apaixone-se pelo progresso, por sua capacidade de se transformar e de transformar o mundo.
Apaixone-se por uma pessoa que ainda vai nascer.
Uma pessoa capaz de fazer perguntas, como Aristóteles ou Platão, capaz de ouvir, como Vivaldi ou Verdi, capaz de ver a natureza, como Van Gogh ou Renoir e tantos outros, capaz de usar as mãos com a habilidade de um Rodin ou de um Michelangelo.
Apaixone-se pela tarefa de ser parteiro de si mesmo, pela missão de dar-se à luz por vontade própria.
Apaixone-se por você amanhã.
Mas faça isso, enquanto é hoje..."

Desconheço a autoria do texto

domingo, 23 de novembro de 2008

Uma Panela de Água e Sal


"Não acredito em grandes mudanças neste tempo de ideologias confusas e cabeças loucas, mas tenho esperança em algumas transformações individuais"

O habitual rio de desgraças nos chega pelos jornais e TVs: política e polícia, mediocridade geral e alienação particular, todo o drama humano – não insolúvel, mas nunca resolvido. A crise atual, que mal começa e vai piorar, tem de um lado o medo, de outro a arrogância, e produz férias forçadas ou desemprego. Tem gente que ainda diz que não há crise. Tem gente cortando despesas e tremendo nas bases do otimismo, por modesto que ele seja. Tem gente mandando a gente deixar de bobagem e consumir. Que fazer?

Os vinte grandes do mundo – em parte responsáveis pelo que nos atinge – almoçam em torno de uma mesa luxuosa num intervalo do seu jogo de vantagens, poder e enganos. Num país vizinho, uma mãe de 20 anos com cara de anciã e menos de 1,5 metro de altura, com um bando de filhos mirrados, segura um bebê, o único que vagamente sorri. Indagada sobre o que tem em casa para lhes dar de comer, a mãe responde olhando para o jornalista: "Hoje é uma panela com água e sal". Fala quase num tom de quem pede desculpas. A panela aparece, realmente fumega no fogãozinho de pedras dentro do casebre. Desligo o noticioso como se fosse um filme obsceno – é um filme obsceno. Mas ligo outra vez: é preciso saber. Notícias da pobreza brasileira: crianças comendo nos lixões, mais famílias meio anãs porque desnutridas, um menino esquelético de belíssimos olhos escuros cansado de carregar água ladeira acima – baldes de água leitosa tirada de uma poça barrenta.

Enquanto isso, trilhões em dinheiro circulam pelos mercados (Vou receber e-mails repetindo que empobrecer os ricos não ajuda aos pobres: nem todos entendem o que escrevo, mas botar a cara na janela é para isso também.). Não acredito em grandes mudanças neste tempo de ideologias confusas e cabeças loucas, em que a gente muda de partido ou de ideal como quem compra um celular novinho. Mas tenho esperança em algumas transformações individuais. Talvez esteja me tornando ferrenhamente individualista, não por egoísmo, mas por esperar que cada um tente fazer a sua pequena parte. Trabalho de formiguinha: se alguém pagar à empregada o melhor que pode pagar, em vez de lhe dar o mínimo que a lei exige alguma coisa já mudou. Se, em vez de querermos atordoadamente ter e aparecer, participar e pertencer e sobressair, pensarmos em alegria e afetos; se acreditarmos que o bom e o belo são possíveis, apesar de tudo; se conseguirmos ser um pouco menos cegos e arrogantes, quem sabe começaremos a cair na real e a ajeitar a ordem do mundo que anda tão torta.

Um pai de aluno, numa escola onde estive, estava preocupado com "o excesso de possibilidades que se oferecem a jovens e crianças", e com razão. Isso é tão preocupante quanto a vasta miséria. A desigualdade sempre vai existir, pois não somos bonecos feitos em série: haverá os menos talentosos, os mais inteligentes, os mais enérgicos e os menos capazes. Mas aquela mãe com seus filhos esqueléticos não precisavam existir. Agora, na televisão, três crianças, de 5, 7 e 8 anos, três lindas menininhas, enchem pequenos baldes com areia. Não é para brincar: elas estão, diz o irmão de uns 12 anos, "trabalhando". Ajudam a família carregando areia morro acima, a prefeitura do seu vilarejo paga por isso. Não é no Brasil, mas é perto, e, com certeza, por aqui temos esse tipo de crime. Essa gente não pensa em crise: do nascimento à morte, sua vida é uma escuridão de fundo de poço. Para eles, o que conta é a dor da barriga sem comida e a da alma sem esperança.

Desligo a TV e vou cuidar da vida. Carrego, mais do que o caos nas finanças do mundo, o palavrório dos vinte figurões e as dificuldades que se avolumam. Aquela mãe de metro e meio com seus sete filhos tristes. O pano de fundo é uma fumegante panela de água com sal, toda a sua refeição para esse dia.
Crônica de Lya Luft, publica na revista Veja, Edição 2088
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